{"id":657,"date":"2022-10-13T16:32:59","date_gmt":"2022-10-13T19:32:59","guid":{"rendered":"https:\/\/igorbarenboim.com.br\/?p=657"},"modified":"2022-10-13T16:32:59","modified_gmt":"2022-10-13T19:32:59","slug":"psicologia-das-financas","status":"publish","type":"post","link":"https:\/\/igorbarenboim.com.br\/pt-br\/psicologia-das-financas\/","title":{"rendered":"A psicologia das finan\u00e7as: como nossos instintos tornam o mercado imprevis\u00edvel"},"content":{"rendered":"
Por Bruno Vaiano<\/em><\/p>\n
O mercado financeiro \u00e9 uma entidade t\u00e3o imperfeita quanto os humanos que o comp\u00f5em: cada investidor est\u00e1 sujeito a arapucas psicol\u00f3gicas irracionais. Juntos, eles formam um\u00a0ecossistema darwiniano \u2013 no qual vence quem domar melhor seu instinto.<\/p>\n
\u201cVoc\u00ea j\u00e1 ouviu a hist\u00f3ria do economista que encontrou uma nota de R$ 100 no ch\u00e3o?\u201d, me pergunta Igor Barenboim,<\/strong> professor de finan\u00e7as da FGV.<\/p>\n
\u201cN\u00e3o.\u201d<\/p>\n
\u201cEnt\u00e3o, ele n\u00e3o pega, porque se a nota fosse de verdade, algu\u00e9m j\u00e1 teria pegado.\u201d<\/p>\n
Para um acad\u00eamico das antigas \u2013 n\u00e3o \u00e9 o caso de Igor<\/strong> \u2013, a piadinha ilustra o conceito mais determinante do mercado financeiro, o de que n\u00e3o existe almo\u00e7o gr\u00e1tis. O pre\u00e7o de uma a\u00e7\u00e3o, em um certo dia e um hor\u00e1rio, resulta de toda a informa\u00e7\u00e3o dispon\u00edvel aos investidores at\u00e9 aquele instante no tempo: os \u00faltimos balan\u00e7os trimestrais, o discurso mais recente do CEO, a descoberta de que houve corrup\u00e7\u00e3o num neg\u00f3cio em que empresa se envolveu etc. As not\u00edcias mexem com a cota\u00e7\u00e3o no momento exato em que v\u00eam a p\u00fablico.<\/p>\n
A consequ\u00eancia l\u00f3gica disso \u00e9 que n\u00e3o \u00e9 simples comprar um ativo de pre\u00e7o aparentemente subestimado na esperan\u00e7a de que ele suba. N\u00e3o existe \u201cpre\u00e7o errado\u201d. O conjunto de investidores seria plenamente eficaz em precificar os pap\u00e9is. Ou seja: uma a\u00e7\u00e3o que caiu 90% nunca estaria \u201cbarata demais\u201d (al\u00f4, IRBR3), pronta para enriquecer quem entrar nela hoje. O valor atual \u00e9 o certo para o momento e pronto.<\/p>\n
Existem algumas demonstra\u00e7\u00f5es emp\u00edricas desse fen\u00f4meno. A mais conhecida est\u00e1 num artigo cient\u00edfico publicado em 1969 pelo pr\u00eamio Nobel Eugene Fama e seus colegas. Eles analisaram 940 splits de a\u00e7\u00f5es realizados entre 1927 e 1959.<\/p>\n
Um split \u00e9 o seguinte: uma empresa abriu capital com 10 mil a\u00e7\u00f5es de R$ 10 \u2013 um IPO bem humilde. Anos depois, ela cresceu e chegou a um market cap de R$ 1 bilh\u00e3o. Cada a\u00e7\u00e3o, agora, vale R$ 100 mil \u2013 um valor alto demais para garantir liquidez na bolsa. O jeito, ent\u00e3o, \u00e9 pic\u00e1-la em centenas de a\u00e7\u00f5es menores, para que mais gente possa negoci\u00e1-la. Esse \u00e9 o split \u2013 numa vers\u00e3o exagerada, para ficar did\u00e1tico. Na pr\u00e1tica, quase nenhuma a\u00e7\u00e3o passa de R$ 100 sem ser picada.<\/p>\n
A manobra n\u00e3o muda nada para os s\u00f3cios: voc\u00ea era dono de uma a\u00e7\u00e3o de R$ 100 mil, e passa a ser dono de 10 mil a\u00e7\u00f5es de R$ 10. Mas, como haver\u00e1 mais negocia\u00e7\u00f5es e os pap\u00e9is j\u00e1 vinham bem, a chance \u00e9 que a a\u00e7\u00e3o suba logo ap\u00f3s o split.<\/p>\n
Ou n\u00e3o? Em seu estudo, Fama e seus colegas verificaram o que era mais importante para o mercado: se era a not\u00edcia do split, em geral dada com alguma anteced\u00eancia, ou o split em si. N\u00e3o deu outra: o\u00a0normal \u00e9 que a alta mais relevante aconte\u00e7a no dia do an\u00fancio. Ou seja: o mercado incorpora imediatamente a informa\u00e7\u00e3o do split ao pre\u00e7o. E o futuro se torna imprevis\u00edvel novamente.<\/p>\n
Essa \u00e9 a conclus\u00e3o de um dos artigos cl\u00e1ssicos das finan\u00e7as: \u201cProva de que pre\u00e7os antecipados corretamente flutuam de maneira aleat\u00f3ria\u201d, publicado em 1965 pelo (tamb\u00e9m Nobel) Paul Samuelson.\u00a0Consolidava-se ali a Hip\u00f3tese dos Mercados Eficientes (EMH).<\/p>\n
Samuelson se baseia no doutorado do matem\u00e1tico franc\u00eas Louis Bachelier, feito em 1900. Ali, ele prova que o pre\u00e7o de um ativo no mercado financeiro flutua segundo o mesmo modelo matem\u00e1tico por tr\u00e1s do\u00a0movimento browniano \u2013 que \u00e9 o agito aleat\u00f3rio de uma mol\u00e9cula em um fluido (l\u00edquido ou g\u00e1s) conforme ela colide com todas as outras mol\u00e9culas ao seu redor.<\/p>\n
Ambos s\u00e3o exemplos de processos estoc\u00e1sticos, em que o desfecho dos acontecimentos no passado n\u00e3o interfere no presente: se voc\u00ea jogar uma moeda oito vezes e ela der coroa em todas, a chance de dar cara no pr\u00f3ximo lance continua sendo 50%. O Universo n\u00e3o tem um mecanismo m\u00e1gico de compensa\u00e7\u00e3o. Do mesmo jeito, a chance de uma a\u00e7\u00e3o subir ou descer no futuro n\u00e3o depende das subidas e descidas do\u00a0passado.<\/p>\n
Decorre disso que a \u00fanica estrat\u00e9gia de investimentos eficaz \u00e9: monte uma carteira diversificada, com a\u00e7\u00f5es s\u00f3lidas, e aceite que voc\u00ea, sozinho, n\u00e3o pode ser mais esperto que o mercado \u2013 na impossibilidade\u00a0de venc\u00ea-lo, junte-se a ele. Quando a economia crescer, seu saldo em a\u00e7\u00f5es cresce junto. Qualquer coisa fora disso \u00e9 sorte \u2013 e se for para tentar a sorte, melhor ir a uma lot\u00e9rica.<\/p>\n
O problema \u00e9 que a EMH e sua aleatoriedade dependem da premissa de que cada ator age de maneira racional, utilizando tal racionalidade para obter os maiores ganhos poss\u00edveis. Seria perfeito, caso f\u00f4ssemos rob\u00f4s. Mas somos entidades biol\u00f3gicas, com instintos tortos, programados pela sele\u00e7\u00e3o natural. \u00c0s vezes, o mercado reage de forma selvagem, e cria distor\u00e7\u00f5es nos pre\u00e7os. Alguns ativos ficam,\u00a0sim, mais baratos do que deveriam, criando oportunidades de compra; ou extraordinariamente mais caros, engatilhando bolhas irracionais.<\/p>\n
Investidores sempre souberam disso \u2013 de outra forma, n\u00e3o existiria um mercado. \u201cEu acho que os traders sabem que h\u00e1 dinheiro para se ganhar no mercado, que existem coisas que parecem fora do lugar\u201d,\u00a0diz Igor.<\/strong> \u201c\u00c0s vezes, voc\u00ea \u00e9 mesmo o primeiro a encontrar a nota de R$ 100 no ch\u00e3o, e ela \u00e9 leg\u00edtima. Essas notas existem.\u201d<\/p>\n
A partir dos anos 1970, alguns economistas perceberam a necessidade de modificar a frieza newtoniana da EMH para incorporar o comportamento humano, e montar uma teoria realmente completa sobre a\u00a0mec\u00e2nica do mercado. O primeiro passo foi criar um grande cat\u00e1logo dos trope\u00e7os e deslizes que interferem na forma como n\u00f3s (investidores ou n\u00e3o) tomamos nossas decis\u00f5es.<\/p>\n
Foto psicologia das finan\u00e7as – an\u00e1lise<\/strong><\/p><\/div>\n
Pregui\u00e7a de pensar<\/h3>\n
Pessoas, em m\u00e9dia, t\u00eam pregui\u00e7a de pensar, e decidem com base em intui\u00e7\u00e3o ou em regras padronizadas e simplificadas (as heur\u00edsticas, na linguagem acad\u00eamica) em vez de fazer contas. Ou seja: h\u00e1 quem\u00a0considere consumo de gasolina, IPVA, seguro, manuten\u00e7\u00e3o e tantas outras vari\u00e1veis na hora de comprar um carro. Mas h\u00e1 quem compre um SUV porque, sei l\u00e1, tem um monte na rua e \u00e9 bonitinho.<\/p>\n
Diversos economistas com um p\u00e9 na psicologia e psic\u00f3logos com um p\u00e9 na economia \u2013 como Richard Thaler e a dupla Daniel Kahneman e Amos Tversky \u2013 mapearam os vieses cognitivos que interferem nas\u00a0finan\u00e7as em todos os n\u00edveis, de decis\u00f5es dom\u00e9sticas ao gerenciamento de fundos bilion\u00e1rios. Vamos explicar algumas dessas fraquezas.<\/p>\n
Por exemplo: se um livro custa R$ 40 em uma loja e R$ 50 na outra, voc\u00ea provavelmente opta por ir \u00e0 primeira. Mas se voc\u00ea precisa escolher entre uma TV de R$ 2.000 e uma de R$ 1.990, \u00e9 mais prov\u00e1vel que voc\u00ea ignore a diferen\u00e7a \u2013 como se R$ 10 valessem menos quando o valor do produto \u00e9 ordens de magnitude maior.<\/p>\n
Algo similar acontece quando voc\u00ea bebe sua restitui\u00e7\u00e3o do IR no bar como se a grana fosse presente. Na verdade, \u00e9 dinheiro que voc\u00ea j\u00e1 tinha, deu para o governo e agora voltou \u2013 s\u00f3 parcialmente \u2013 para sua conta. Em 1999, Thaler denominou esse fen\u00f4meno mental accounting, \u201ccontabilidade mental\u201d: embora cada unidade de dinheiro tenha valor id\u00eantico (o dinheiro \u00e9 fung\u00edvel, no jarg\u00e3o), n\u00f3s colocamos\u00a0dinheiros do cotidiano em caixinhas imagin\u00e1rias diferentes. Isso nos ajuda a pensar sobre nossas despesas, mas tamb\u00e9m leva a decis\u00f5es irracionais.<\/p>\n
Outro cl\u00e1ssico do c\u00e9rebro \u00e9 a ancoragem. Por exemplo: na minha cabe\u00e7a, meio queijo minas padr\u00e3o \u00e9 sin\u00f4nimo de R$ 20. Por\u00e9m, por causa da infla\u00e7\u00e3o, j\u00e1 faz algum tempo que ele custa R$ 30, R$ 35.\u00a0Resultado: estou sem comprar queijo h\u00e1 meses. Cismei com um valor de refer\u00eancia, e n\u00e3o consigo reajust\u00e1-lo.<\/p>\n
Os primeiros experimentos de Kahneman com ancoragem envolviam resolver uma multiplica\u00e7\u00e3o: 1 x 2 x 3 x 4 x 5 x 6 x 7 x 8. Depois, ao contr\u00e1rio: 8 x 7 x 6 x 5 x 4 x 3 x 2 x 1. Os volunt\u00e1rios do estudo recebiam uma pequena quantidade de tempo para dar um chute sobre o resultado; tempo insuficiente para completar a conta (que d\u00e1 40.320 \u2013 nos dois casos, claro). E ent\u00e3o eram convidados a estimar o valor. Quem pegou a multiplica\u00e7\u00e3o em ordem crescente chutou, em m\u00e9dia, 512. Em ordem decrescente, 2.550. Os chutes se apoiaram inconscientemente nos resultados das primeiras multiplica\u00e7\u00f5es \u2013 as que os\u00a0volunt\u00e1rios tiveram tempo de completar.<\/p>\n
Outra contribui\u00e7\u00e3o da dupla Kahneman e Amos foi estudar um par de vieses cognitivos chamados avers\u00e3o ao risco e avers\u00e3o \u00e0 perda. A vers\u00e3o simples da explica\u00e7\u00e3o \u00e9 a seguinte: em m\u00e9dia, a tristeza de\u00a0perder R$ 1 mil \u00e9 maior do que a alegria de ganhar R$ 1 mil.<\/p>\n
A consequ\u00eancia disso: quando alguma a\u00e7\u00e3o que voc\u00ea tem na carteira sobe, sei l\u00e1, 60%, voc\u00ea fica se co\u00e7ando para vender logo e ter a satisfa\u00e7\u00e3o de realizar o lucro. Como disse o Faria Lima Elevator no\u00a0Twitter: \u201cSabe aquela hist\u00f3ria de \u2018se voc\u00ea tivesse comprado a a\u00e7\u00e3o tal h\u00e1 alguns anos, teria 1.000% de lucro hoje\u2019? Ent\u00e3o: voc\u00ea teria vendido bem antes\u201d. Economia comportamental na veia.<\/p>\n
Por outro lado, se voc\u00ea perde 60%, tende a abra\u00e7ar essas a\u00e7\u00f5es. E at\u00e9 a comprar mais na esperan\u00e7a de que elas voltem a subir para \u201cdiminuir o pre\u00e7o m\u00e9dio\u201d (quem nunca?).<\/p>\n
O medo de realizar o preju\u00edzo, de materializar a perda, \u00e9 um instinto profundo. E que causa distor\u00e7\u00f5es irracionais. N\u00e3o houvesse esse impulso por comprar mais, o pre\u00e7o da a\u00e7\u00e3o cairia com ainda mais\u00a0viol\u00eancia. J\u00e1 pap\u00e9is de companhias exemplares podem parar de subir simplesmente porque o impulso pela realiza\u00e7\u00e3o do lucro criou uma liquida\u00e7\u00e3o irracional de boas a\u00e7\u00f5es.<\/p>\n
A lista de vieses vai longe. Continuando, existe a ilus\u00e3o de superioridade (o famoso \u201ceu sei que a maioria dos traders n\u00e3o consegue bater o mercado, mas eu consigo\u201d) e o vi\u00e9s de confirma\u00e7\u00e3o \u2013 quando o investidor aceita mais facilmente uma informa\u00e7\u00e3o que confirma as cren\u00e7as que ele j\u00e1 tinha, mas \u00e9 resistente a informa\u00e7\u00f5es que contrariam suas cren\u00e7as. Para n\u00e3o falar no efeito manada, que dispensa\u00a0explica\u00e7\u00f5es: \u201cse todo mundo est\u00e1 comprando esse tro\u00e7o, deve ser uma boa\u201d.<\/p>\n
Outra dupla de vieses \u2013 estes aqui, primos pr\u00f3ximos um do outro \u2013 ser\u00e3o especialmente importantes mais para a frente neste texto:<\/p>\n
Um \u00e9 o vi\u00e9s de disponibilidade. A Covid-19 chegou a matar o equivalente a quatro Boeings 747 cheios de brasileiros por dia, mas as mortes n\u00e3o causavam uma como\u00e7\u00e3o equivalente \u2013 porque acidentes de avi\u00e3o ficam mais em evid\u00eancia tanto na m\u00eddia como em nosso imagin\u00e1rio. De maneira parecida, se voc\u00ea est\u00e1 sendo bombardeado com not\u00edcias de alta no Bitcoin e de bancos que passaram a operar como exchanges de cripto, fica parecendo que esse \u00e9 um investimento t\u00e3o seguro quanto t\u00edtulos p\u00fablicos, quando na verdade \u00e9 mais arriscado do que op\u00e7\u00f5es de compra, vendas a descoberto, d\u00f3lar futuro e\u00a0outras modalidades distantes do dia a dia dos investidores n\u00e3o profissionais.<\/p>\n
Outro \u00e9 o vi\u00e9s de representatividade. De acordo com Igor,<\/strong> \u00e9 o que acontece quando o mercado aposta que tal empresa pode se tornar o pr\u00f3ximo Google. O problema: a quantidade de Googles, ou seja, de empresas que mudaram a hist\u00f3ria da humanidade, \u00e9 \u00ednfima. Mas disso ningu\u00e9m gosta de lembrar. Isso faz com que o mercado, em m\u00e9dia, reaja demais \u00e0s not\u00edcias boas sobre \u201co pr\u00f3ximo Google\u201d \u2013 ou \u00e0 \u201cnova Magalu\u201d; ou \u00e0 Magalu em si, quando ela era vista como uma pr\u00f3xima Amazon. E o resultado \u00e9 a valoriza\u00e7\u00e3o irracional de alguns ativos.<\/p>\n
Moral da hist\u00f3ria: errar \u00e9 humano. Nossas cabe\u00e7as evolu\u00edram para usar atalhos que, na pr\u00e9-hist\u00f3ria, nos permitiam tomar decis\u00f5es rapidamente \u2013 se todo mundo come\u00e7a a correr, v\u00e1 junto; provavelmente apareceu um predador e s\u00f3 voc\u00ea n\u00e3o viu. Esses atalhos, por\u00e9m, criam armadilhas hoje, como comprar cripto ou novas Magalus por efeito manada. \u00c9 o pensamento r\u00e1pido (instintivo) vs. devagar (racional)\u00a0descrito por Kahneman em seu maior best seller.<\/p>\n
H\u00e1 centenas de experimentos que comprovam a exist\u00eancia de cada um desses fen\u00f4menos no cotidiano e no mundo das finan\u00e7as. Mas como transform\u00e1-los em n\u00fameros? Como incorpor\u00e1-los a um modelo matem\u00e1tico\u00a0que descreva a realidade do mercado financeiro melhor que as equa\u00e7\u00f5es dos mercados eficientes \u2013 esse mundinho te\u00f3rico ideal onde n\u00e3o h\u00e1 bolhas?<\/p>\n
Foto psicologia das finan\u00e7as – gr\u00e1ficos<\/strong><\/p><\/div>\n
Darwin explica<\/h3>\n
A primeira e mais conhecida proposta fechada para remendar a ideia dos mercados eficientes foi a Hip\u00f3tese dos Mercados Adaptativos, consagrada por Andrew Lo, um professor de economia do MIT, em 2004. Lo foi o primeiro a tentar uma s\u00edntese entre a EHM e as finan\u00e7as comportamentais de Kahneman \u2013 admitindo que o mercado \u00e9 eficiente e racional \u00e0s vezes, mas usando os vieses cognitivos para explicar\u00a0os momentos em que ele n\u00e3o \u00e9.<\/p>\n
Lo pensa na bolsa de valores como um habitat, em que v\u00e1rios indiv\u00edduos de uma mesma esp\u00e9cie \u2013 a humana, no caso (rs) \u2013 disputam dinheiro. Os investidores que adotam a estrat\u00e9gia mais racional enchem\u00a0os bolsos em detrimento dos que operam de maneira ineficaz. Da mesma forma que, na natureza, indiv\u00edduos que nascem mais aptos a sobreviverem no seu meio t\u00eam mais filhotes e espalham seus genes.<\/p>\n
Acontece que \u201capto\u201d \u00e9 um termo relativo. Depende do contexto: um investidor que encheu os bolsos especulando em v\u00e1rios anos seguidos de bull market \u2013 uma \u00e9poca de alta nas a\u00e7\u00f5es \u2013 tende a jogar de modo a se beneficiar de altas. Ele faz isso porque \u00e9 o que sempre fez, e d\u00e1 certo (pense em algu\u00e9m que come\u00e7ou a operar na bolsa em 2003 e chegou em 2008 sem ter visto um \u00fanico ano de queda no\u00a0Ibovespa).<\/p>\n
Assim, o mercado tem longos momentos de estabilidade e efici\u00eancia, em que os investidores se comportam cada vez mais como agentes racionais, porque refinam suas estrat\u00e9gias para lucrar cada vez mais\u00a0com base na situa\u00e7\u00e3o vigente.<\/p>\n
At\u00e9 que vem um problema. \u201cQuando acontece um choque econ\u00f4mico \u2013 como a Covid-19 \u2013, o mercado se desorganiza\u201d, explica Marco Aur\u00e9lio dos Santos, pesquisador da FGV. \u201cEle fica menos eficiente at\u00e9 que os\u00a0agentes entendam qual \u00e9 o cen\u00e1rio e quais s\u00e3o as estrat\u00e9gias vencedoras. A\u00ed ele volta a tender \u00e0 efici\u00eancia.\u201d<\/p>\n
No momento em que uma bolha estoura, um trader que aposta em altas agora desaba junto com suas a\u00e7\u00f5es e derivativos. A estrat\u00e9gia que era eficaz se tornou ineficaz no dia seguinte. E d\u00e1 lugar a uma nova estrat\u00e9gia, que j\u00e1 \u00e9 dominada por outros jogadores. O clima vira e fica bom para os ursos \u2013 os que apostam nas baixas, lucrando com vendas a descoberto. Eles j\u00e1 s\u00e3o especialistas nesse jogo, afinal.<\/p>\n
A hip\u00f3tese dos mercados adaptativos foi s\u00f3 o come\u00e7o. Os acad\u00eamicos se esfor\u00e7am cada vez mais para incluir o comportamento humano em modelos matem\u00e1ticos que recriam o funcionamento do mercado de\u00a0verdade. Um dos protagonistas nessa obra \u00e9 o economista russo-americano Andrei Shleifer, de Harvard. Shleifer e sua turma criaram um modelo que leva em considera\u00e7\u00e3o o vi\u00e9s de representatividade.<\/p>\n
Esse grupo verificou, por observa\u00e7\u00e3o emp\u00edrica, que analistas de bancos e corretoras costumam dobrar os n\u00fameros que chegam \u00e0s suas m\u00e3os quando est\u00e3o diante de um \u201cpr\u00f3ximo Google\u201d. Se o lucro de uma\u00a0empresa queridinha das not\u00edcias aumentou 10%, os analistas passam a prever altas de uns 20% no pre\u00e7o da a\u00e7\u00e3o, e influenciam o mercado a tornar isso realidade.<\/p>\n
Eles tamb\u00e9m determinaram que esse tipo de rea\u00e7\u00e3o exagerada dura em m\u00e9dia tr\u00eas anos \u2013 depois, a tend\u00eancia \u00e9 que o ativo volte ao pre\u00e7o que deveria ter no contexto de um mercado eficiente.<\/p>\n
Parece \u00f3bvio. E \u00e9 \u00f3bvio: analistas ficam excessivamente otimistas, as a\u00e7\u00f5es se valorizam mais do que o justo e o valor de mercado infla. Mas quantificar esse fato, com base em montanhas de dados \u2013 e\u00a0ent\u00e3o gerar um gr\u00e1fico \u201cde laborat\u00f3rio\u201d que pare\u00e7a um gr\u00e1fico real de bolha numa a\u00e7\u00e3o \u2013, \u00e9 um feito da ci\u00eancia (e recente: o trabalho descrito acima foi publicado em 2019).<\/p>\n
Talvez seja um sinal de que estamos cada vez mais pr\u00f3ximos de antecipar o imponder\u00e1vel. E de transformar a economia em algo parecido com a utopia descrita na trilogia Funda\u00e7\u00e3o de Asimov: uma ci\u00eancia\u00a0social exata, capaz de prever os auges e colapsos das finan\u00e7as e da economia \u2013 e, por tabela, de toda a humanidade.<\/p>\n
Por Bruno Vaiano O mercado financeiro \u00e9 uma entidade t\u00e3o imperfeita quanto os humanos que o comp\u00f5em: cada investidor est\u00e1 sujeito a arapucas psicol\u00f3gicas irracionais. Juntos, eles formam um\u00a0ecossistema darwiniano \u2013 no qual vence quem domar melhor seu instinto. \u201cVoc\u00ea j\u00e1 ouviu a hist\u00f3ria do economista que encontrou uma nota de R$ 100 no ch\u00e3o?\u201d, […]<\/p>\n","protected":false},"author":1,"featured_media":658,"comment_status":"open","ping_status":"open","sticky":false,"template":"","format":"standard","meta":[],"categories":[5],"tags":[],"acf":[],"yoast_head":"\n
A psicologia das finan\u00e7as: como nossos instintos tornam o mercado imprevis\u00edvel | Igor Barenboim<\/title>\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\n\t\n\t\n\t\n\n\n\n\t\n\t\n\t\n